O barco, as marés e o propósito organizacional

Como sua organização pode navegar com mais assertividade em 2020?

Começo de 2020, para algumas organizações, empreendedores e profissional liberal início de novo ano, de nova década e chance de recomeço. Aparentemente o cenário é de boas perspectivas, principalmente se for visualizado como parâmetro os últimos anos de crise porque passou o Brasil. Claro que com a tensão no Oriente Médio, conflito EUA x Irã, este cenário pode mudar rapidamente.

O primeiro aspecto é que em qualquer momento ou etapa da vida os indivíduos e as organizações sempre querem mudar algo, chegar a algum lugar, promover transformações consistentes que viabilizem o alcance dos objetivos e sonhos. Mas não basta saber onde querem chegar, essa é a parte mais fácil.

Esta viagem requer foco, paciência, engajamento e uma imensa coragem para mergulhar nas profundezas da alma de cada um dos tripulantes desse barco. O imediatismo, olhar generalizado e desatento desprezando os detalhes, sem análise criteriosa dos dados e informações, podem contribuir para o fracasso da viagem e ampliar os riscos de deriva em alto mar. Examinar cada cantinho vai poupar a todos de muita dor de cabeça e atrasos no itinerário.

Se realmente querem chegar ao destino, sugerimos atentar para algumas questões, por exemplo:

  • Já foram avaliados quais recursos estão ao alcance imediato?
  • Sabem quais os desafios que não estão sob controle e que podem ter que enfrentar no meio do caminho?
  • Sabem como se preparar para superar os obstáculos que possam surgir nessa trajetória?

Se a vida da sua organização fosse uma viagem, com cidades turísticas que vocês querem conhecer ao longo do caminho (o propósito, a identidade organizacional, as metas e resultados almejados, etc.), conhecer o barco (negócio, mercado, diferencial competitivo, competências dos seus integrantes, possibilidades e oportunidades, concorrentes, etc.), as alterações e melhorias que vocês e os demais integrantes da organização podem fazer nele, é essencial.

Fazendo uma analogia, podem-se entender as marés por onde o barco vai passar como as outras pessoas e as circunstâncias do ambiente externo onde a organização interage e está inserida. Nesse mergulho muitos fatores serão identificados e não poderão ser mudados, porém serão fundamentais para se adquirir alguma consciência sobre como funcionam.

Através do autoconhecimento e do diagnóstico situacional, pode-se enxergar todas as engrenagens e mecanismos do barco e planejar, preparar a viagem. A capacidade investigativa do líder deve ser canalizada para compreender melhor os integrantes desse barco (comandante, marinheiros, tripulação, passageiros, prestadores de serviços especializados, pessoas que impactam ou são impactadas pelas operações do barco, pontos fortes, pontos fracos, etc.) e identificar, entre outros dados, os seus interesses, emoções, crenças, padrões de comportamento, programações inconscientes, bem como entender o que sentem, porque sentem, porque agem e reagem de determinada maneira, porque determinada situação sempre acontece com a organização, e por aí vai.

Mas, não pensem que após conhecer este barco (vocês mesmos) e as marés (o mercado e suas tendências, cenário estratégico organizacional, mudanças em políticas públicas, estratégias governamentais, etc..), basta inserir as coordenadas e seguirem viagem no piloto automático.

Pode-se até conhecer as correntes marítimas, evitar alguns trechos perigosos, pegar alguns atalhos, mas não é possível mudar a maré. Não adianta chorar e culpar a maré por não ter conseguido chegar ao destino almejado: as marés não vão mudar só por você e/ou pela sua organização. É o equilíbrio entre mudar o que dá para ser mudado e compreender o que não dá para ser mudado. Nem vítima dos outros, nem algoz de si mesmo. Nem vítima das marés, nem com a soberba organizacional.

Ao longo dos 28 anos de atuação como consultores em organizações de diversos segmentos e portes, alguns aprendizados queremos aqui compartilhar:

  1. O êxito ou fracasso dessa viagem são relativos à importância dada pelas lideranças ao exercício da presença, com foco na construção de vínculos, na disseminação e manutenção dos valores organizacionais, na valorização, no desenvolvimento e incentivo contínuo das pessoas e o engajamento dos times.
  2. A compreensão das lideranças sobre os impactos dos ativos intangíveis, os chamados elementos existentes na cultura organizacional, na tomada de decisão e engajamento dos líderes e liderados é essencial. A identidade, o propósito e o significado organizacional quando bem trabalhados e integrados à gestão empresarial, às estratégias de negócio, a comunicação estratégica e ás práticas operacionais, têm uma força incrível e impulsionam, em muito, as chances de uma viagem fantástica mesmo em marés turbulentas.
  3. A preparação e capacidade das lideranças para perceber e discernir as armadilhas geradas pelos discursos mágicos ou fantasiosos, os trabalhos de “oba oba” que estimulam o “eu acredito”, “estamos todos no mesmo barco”; “somos uma família”, sem a devida sustentação em um modelo e práticas de gestão, em indicadores mesmo que indiretos instrumentos esses que deem suporte ao monitoramento e mensuração dos resultados focados nos elementos tangíveis e intangíveis, refletem na construção de uma cultura de confiança, com engajamento e presença que irão sustentar a organização mesmo em momentos de turbulência.
  4. Independente do porte da empresa a realização de ações no campo do planejamento, tanto estratégico como operacional, podem refletir positivamente ou não frente aos resultados almejados pelas lideranças, vez que planejar não é realizar. A implementação da ação planejada depende essencialmente da vontade e disponibilidade dos indivíduos e dos times, o que se dá a partir da compreensão, de cada integrante do sistema organizacional, no impacto do seu trabalho no todo, de como percebe o seu reconhecimento pelo esforço e dedicação com os resultados da empresa.

Não existe uma “rota ideal” que sirva para todas as organizações. Vão ter imprevistos durante a viagem e decisões de última hora terão que ser tomadas com vistas a definir o que fazer. E nem sempre serão boas decisões, mas serão decisões conscientes, com todos os integrantes da organização segurando o leme da Identidade e Propósito Organizacional, assumindo o controle da situação, a responsabilidade e as consequências das escolhas que fizeram.

Como diria Nietzsche: “Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida – ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o!”

Fábio Rocha

Especialista em Carreira, Consultor em Sustentabilidade, Professor, Coach e Diretor-Executivo da Damicos Consultoria em Liderança e Sustentabilidade.

Maiza Neville

Especialista em Carreira, Consultor em Gestão de Pessoas por Competências, Professora, Coach e Diretora-Executiva da Damicos Consultoria em Liderança e Sustentabilidade.